quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013


Introdução ao Método Teológico


A Teologia e a Filosofia compõem as chamadas "Ciências Sagradas". Diferentemente das outras ciências que estudam basicamente um recorte do ser humano, ambas procuram contemplar o "todo": a Filosofia procura pelo todo partindo da razão humana; a Teologia, da revelação divina. Os antigos filósofos compreendiam que se tratava da mesma ciência, contudo, abordando a realidade a partir de perspectivas diferentes.
Até as escolas catedrais e os mosteiros, na Idade Média, o que se ensinava era que o homem tinha que ser completo, ou seja, possuir o conhecimento acadêmico, mas também e, principalmente, conhecer e exercitar as virtudes. Com o nascimento das universidades, infelizmente, a sintonia entre a vida e o pensamento do filósofo ou do teólogo começou a se quebrar.
O que se vê, atualmente, é a completa ruptura entre a vida cotidiana do pensador e seu pensamento propriamente dito, sendo este, inclusive, o ideal acadêmico. Acontece que não é possível fazer teologia ou filosofia sem viver, de fato, aquilo que se pensa.
Os antigos sabiam muito bem como era imprescindível que houvesse uma relação íntima entre a vida moral do teólogo/filósofo e o seu pensamento. Platão, em sua obra "A República", reafirma a necessidade de uma periagogé, ou seja, uma reviravolta sobre si mesmo. Da mesma forma, Sócrates e Aristóteles criam na necessidade de um olhar profundo para dentro de si mesmo antes de se pensar em fazer filosofia.
Sem a periagogé o que resta é apenas a ideologia, o uso da palavra para atender ao desejo de poder, de dominação, de sedução. O objetivo, nesse caso, seria fazer com que os seduzidos ou dominados fossem levados mansamente conforme o alvitre do dominador.
No campo teológico, o que se tem é a chamada metanoia. Trata-se de uma espécie de conversão também, porém, muito mais profunda, pois requer uma mudança de mentalidade, uma mudança do sujeito. O Cardeal Joseph Ratzinger em seu livro "Natureza e Missão da Teologia", analisa a metanoia partindo da seguinte frase de São Paulo: "eu vivo, mas não eu, é Cristo que vive em mim" (Gal 2,20). Eis:
"a conversão é algo muito mais radical do que, digamos, a revisão de algumas opiniões e atitudes, é um processo de morte. Dito com outras palavras é uma mudança de sujeito, o eu deixa de ser um sujeito autônomo, um sujeito que subsiste em si mesmo; ele é arrancado de si próprio e introduzido num novo sujeito. Não que o eu simplesmente desapareça, mas, de fato, ele tem que deixar-se cair inteiramente para, em seguida, ser concebido novamente num eu maior e juntamente com este."
O que o Cardeal Ratzinger insiste é na necessidade primeira de o sujeito configurar-se a Cristo. Porém, só é possível se configurar-se ao Cristo total por meio da Igreja. Sim, ele é bem claro nesse ponto e continua o raciocínio dizendo que se trata de:
"... um processo sacramental, isto é, de Igreja. O passivo de tornar-se cristão exige o ativo da ação da Igreja, onde a unidade do sujeito do fiel se apresenta corporal e históricamente e só a partir daqui é que pode ser adequadamente entendida a palavra paulina da Igreja como corpo de Cristo, ela se identifica com o revestir-se de Cristo, com o ser revestido de Cristo em que essa nova veste que ao mesmo tempo protege e liberta o cristão é o corpo de Cristo ressuscitado. Isso só é possível pelo batismo."
Assim, antes do fazer teologia, propriamente dito, é preciso haver uma metanoia, uma conversão radical de vida, uma mudança de sujeito. Morrer para si mesmo e adentrar no eu de Cristo por meio da Igreja, pois é ela que muda a forma de pensar e o coração do sujeito.
Sem essa metanoia, sem a busca pelas virtudes, tendo como perspectiva a eternidade, a morte e a finitude da vida, o homem é apenas mais um ser com conhecimento. É evidente que a metanoia não é uma decisão fácil, pois a verdade liberta, mas nem sempre é agradável. No mais das vezes é incômoda e exige uma atitude.
Contudo, sem ela, não é possível fazer teologia. Sem ela, o que se têm são contorcionismos mentais que levam o sujeito cada vez mais na direção da mentira e do engano. Nosso Senhor Jesus Cristo alertou sobre esse perigo quando disse: "vigiai e orai" (Mt 26,41), pois, sabia o quanto seria difícil para o homem manter-se alerta diante do mundo. De fato, a maioria das pessoas vive no que Platão chamava mundo das aparências e não no mundo onde as coisas realmente são. A maioria das pessoas parece dormir, sonhar, delirar, fantasiar. E são justamente essas pessoas que acabam dizendo que a Filosofia e a Teologia tiram o homem da realidade.
Ora, enquanto a maioria dorme, o cristão luta para manter-se acordado, com os olhos abertos. Faz algo para manter a fé, pois ela exige um esforço pessoal, mas não o tira do mundo real, ao contrário, coloca-o nele.
Infelizmente, existe uma força que atrai o homem para fora do real, levando-o ao erro, ao engano, à heresia. Para estar na Verdade é preciso ter a virtude. Por isso que, antes de iniciar o curso de Teologia, é necessário fazer esse exame de consciência e decidir-se pela conversão. Caso contrário, quando a Verdade se apresentar ela não será aceita, nem mesmo reconhecida.
Não é possível fazer Teologia sem um movimento interior de verdadeira conversão, de pertença à Igreja Católica, de participação assídua nos sacramentos, de meditação profunda da Palavra de Deus, pois, a verdadeira Teologia é aquela que se faz de joelhos.

Indicações Bibliográficas

  1. "A Filosofia e seu Inverso & Outros Estudos", Olavo de Carvalho. http://www.ecclesiae.com.br/Ensaios-e-Estudos-Filos%C3%B3ficos/A-Filosofia-e-Seu-Inverso/flypage.tpl.html
  2. Introdução à obra de Eric Voegelin. http://www.olavodecarvalho.org/avisos/intro_eric_voegelin.html
  3. Seminário de Filosofia Olavo de Carvalho. http://www.seminariodefilosofia.org/
  4. "Natureza e Missão da Teologia", Cardeal Joseph Ratzinger: http://www.ecclesiae.com.br/Teologia/Natureza-e-Miss%C3%A3o-da-Teologia/flypage.tpl.html