terça-feira, 8 de setembro de 2015

À sombra do templo




“À sombra do Templo”. Editora Vida, São Paulo, Brasil. [Título original: In the shadow of the temple. Downers Grove, Illinois, EUA.] Páginas 15-39, 99-130.







Síntese dos capítulos 1º e 5º

INTRODUÇÃO
Foi-me dada a tarefa de fazer uma síntese dos capítulos em tela. Não me foi pedido fazer uma resenha crítica, um fichamento ou muito menos uma monografia. Destarte, não me preocuparei se estarei criticando suficientemente, pontuando as ideias e apontando as citações suficientemente ou se o número de páginas será suficientemente grande. Uma boa síntese não é um resumo. Um resumo é uma síntese de um texto maior que não deixa de fora nenhum assunto. Uma síntese não. A síntese, para ser bem feita, deve deixar de fora alguns pontos ou assuntos. Deve trazer somente o mais importante, a fim de, em um texto que não canse o leitor, em poucos minutos, oferecer o que há de melhor no texto. A síntese está para o seu texto como a sinopse está para seu filme. Ou alguém já viu uma sinopse que contasse todo o filme – mesmo que resumidamente? Uma síntese precisa vender o texto. Este creio ser o meu dever aqui.

CAPÍTULO 1º (pp. 15-39)
O capítulo 1° aborda a Dimensão cultural do judaísmo e do helenismo, ou, mais precisamente, a interferência do segundo no primeiro. Mais à frente, também será ventilada a relação entre o helenismo e o cristianismo, com o enfoque na passagem daquele a este pelo judaísmo.
Oskar Skarsaune inicia dizendo que o judaísmo da época de Jesus não era o mesmo das épocas veterotestamentárias, ao contrário do que muitos podem equivocadamente pensar, e que muita coisa aconteceu no período intertestamentário que é-nos relatado mormente na literatura rabínica e cristã-apócrifa, sendo mister recuar sua análise até 160 AEC pelo menos. Aqui, Oskar Skarsaune faz uma análise da Revolução Macabeia.
Depois do exílio babilônico, os judeus da Judeia viveram de maneira semi-autônoma sob o domínio estrangeiro até que, em 175 AEC, subiu ao poder o governante selêucida Antíoco IV Epífanes. Suas exigências despertaram a Revolta Macabeia, que iria dar aos judeus um estado independente reconhecido pelos sírios e somente expugnado pelos romanos em 63 AEC. A revolução dos Macabeus corporifica o status questiones, isto é, a situação de repreensão judaica na questão cultural com o avanço helenístico estrangeiro. Todavia tal repugnância não era unânime entre os judeus. Havia aqueles que, movidos por interesses econômicos, políticos, entre outros, desejavam ter uma Jerusalém helenizada sócio-político-economicamente e uns até procuravam induzir o governo selêucida contra as facções mais resistentes e, por isto, necessariamente mais fieis ao depósito epistêmico-histórico e cultural judaico. Porém, dificilmente havia um judeu que se colocasse totalmente ao lado de Antíoco IV, pois, mesmo para o mais heterodoxo e apóstata judeu, as ações antioquenas ultrapassavam a fronteira da radicalidade. Os diferentes posicionamentos faziam crescer um mal-estar interno no judaísmo. Assim, dificilmente quaisquer dos dois extremos poderia sair cem por cento vitorioso: nem os judeus mais fieis aos seus pais e à Lei, nem os judeus mais apostatados. Desta maneira, os hasmoneus sobem ao poder – após a primeira geração, a geração conquistadora dos macabeus - sob uma classe de judeus filo-helenísticos – um meio-termo entre as posições extremadas. E é nesta dinâmica que um grupo emergente de judeus sintonizados como o helenismo começa a ver o mesmo não mais como nocividade, mas como uma oportunidade para crescimento político e cultural. Estes são os antepassados diretos dos fariseus que viverão na época de Jesus Cristo.
Oskar Skarsaune aponta que, na sociedade em que Jesus viveu, a cultura e o pensamento helenista eram apreciados. Tal fato se deve, inicialmente, ao fato de que as culturas dos povos conquistados não tiveram força política para vencer a cultura de Alexandre. Inevitavelmente, assim, os judeus, os “gregos” e até os apóstolos e discípulos cristãos carregavam o rico pensamento helênico dentro de si. Num pequeno tour de force, Oskar Skarsaune mostra como os gregos helenizaram os povos e como também foram orientalizados por eles, e que esta mistura era visível nas poleis helenísticas (um pouco diferentes das poleis gregas típicas, como Atenas). Porém, atenta o autor, uma cidade, dentre muitas helenizadas ao seu redor, praticava a amixia: Jerusalém. A helenização da Judeia dependia da helenização de Jerusalém, mas os judeus desta cidade mantinham-se à parte do helenismo, para serem fieis à Torá, o que permitiu ao judaísmo até hoje existir.
Mais a frente, o autor coloca a revolução teórica ocorrida no judaísmo hasmoneu pós-selêucida que trouxe um novo conceito de Torá e judaísmo (pp. 28-33). Para os gregos, o Logos era a razão divina anterior à criação e ao qual esta deve se submeter. Os sábios judeus, como que registrando este conceito, aplicaram tal ideia à Lei de Moisés. Assim, “uma vida de acordo com a natureza é também uma vida de acordo com a Torá”. Este insight pode ser chamado de ideia da preexistência e da significação cósmica da Torá e foi emplacado primeiramente pelo autor da Sirácida aproximadamente em 190 AEC. Mais tarde, rabinos deram uma nova interpretação a Gênesis 1:1 – em sintonia com Provérbios 8:22 – e afirmaram que “o modelo com base no qual o mundo foi criado é a Torá de Moisés”.
“O conceito da Torá divina como mediadora preexixtente à criação do mundo – os rabinos a chamam de ‘Filha de Deus’ – é da máxima importância quando se discute de que modo os primeiros judeus que acreditaram em Jesus concebiam sua divindade em relação ao Pai.” (p. 29)
Esta virada hermenêutica na teologia rabínica atinge também o próprio conceito de judaísmo. No mundo antigo, o nome dos grupos e das tribos bem como os aspectos de suas culturas atrelavam-se a sua origem, ou seja, à região onde aquele povo “nasceu”. Com Alexandre, o Grande, porém, grego não era mais só aquele que nascera na Grécia, mas qualquer que passasse a se portar, vestir e pensar como tal – o helenismo era um modus vivendi a que seus “adeptos” podiam se converter. Da mesma maneira, a liderança religiosa israelita, a partir do século II AEC, passa a encarar o judaísmo como um estilo de vida (a palavra judaísmo é inventada aqui para expressar tal modus vivendi) ao qual as pessoas gentias poderiam se converter.
Outra questão importante, lembra o autor, é a presença não somente do grego enquanto pessoa, mas também enquanto língua. O coiné (transliterado koinḗ, original koinή), aproximou os povos quanto ao comércio, à literatura e à cultura. Este dialeto foi fundamental na disseminação ativa do judaísmo e do cristianismo. Através dele, estas religiões alcançaram as principais províncias romanas.
Por fim, Oskar Skarsaune explicita a herança cristã da escatologia judaica. Vivia-se um tempo de judaísmo ativo. Acreditavam os judeus estar muito perto a vinda do Messias. Jesus vem justamente nesta atmosfera. A espera messiânica do judeus transmuta-se na espera parusiástica dos judeus-cristãos. Deste modo, a pregação querigmática dos primeiros cristãos caracteriza-se sobremaneira pelo anúncio de um retorno iminente de Cristo.



CAPÍTULO 5º (pp. 99-130)
Quantos e quais eram os “judaísmos” no primeiro século? Esta pergunta é respondida pelo autor neste capítulo. Ele chama a atenção para o famoso episódio da destruição do Templo de Jerusalém, que liquidou com os judeus, ou, melhor, liquidou com todos exceto o que convencionou chamar de judaísmo rabínico. Todos os partidos judaicos acabaram, mas, por uma atitude, para uns, de covardia, para outros, de inteligência, o judaísmo rabínico prosseguiu nas mãos de Johanan ben Zakkai, que fugira antes do colapso. De modo similar, os cristãos perseguidos, no século I EC, garantiram a prevalência do cristianismo porque fugiram. Esta é, segundo o autor, a teoria tradicional. Mas o judaísmo anterior à destruição de Jerusalém não continuou igualzinho àquele que conseguiu sobreviver. O judaísmo farisaico das primeiras décadas, deu lugar ao judaísmo rabínico.
Nos parágrafos que se seguem, Oskar Skarsaune vai fazendo uma série de revelações surpreendentes. Mostra que Jesus estava muito mais em sintonia com os fariseus do que se pode pensar e que é um erro achar que o judaísmo rabínico pós-setenta-da-era-comum e seus textos (Mixná etc) se inserem no mesmo contexto pré-setenta-da-era-comum.
Os sacerdotes eram o grupo religioso de maior prestígio, já que a vida do judeu orbitava no Templo. Flávio Josefo ainda fala dos saduceus, fariseus e essênios. O autor complementa com o zelotas e fala também do judaísmo sinagogal.
A elite sacerdotal não deixou escritos. Não se pode afirmar muita coisa dela. Sabe-se somente que era composta por sábios de origens variegadas e que não eram saduceus nem pertencentes a qualquer outra facção. Os saduceus, embora menores em número, compunham o judaísmo sacerdotal. Não há informação consolidada quanto ao conteúdo de sua teologia. Flávio Josefo aparenta tendenciosidade na sua descrição. A priori a informação mais disseminada entre os estudiosos da época e também posteriores é que os saduceus não criam na ressurreição dos mortos, nem em anjos, nem em espíritos, nem na imortalidade da alma. As passagens bíblicas que nos trazem lampejos sobre isto, segundo o autor, não são apodícticas. Os essênios, guardadas as menores diferenças entre suas subdivisões, eram de um rigor moral muito grande, muitos retiravam-se para regiões desertas, vestiam-se rusticamente, criam na imortalidade da alma e na necessidade do esforço para se alcançar a justiça. Diferentemente dos saduceus – que se aproximavam mais do epicurismo -, os essênios se apropinquavam mais do estoicismo. Os fariseus destacavam-se pela estrita observância da Lei, pelo sacerdotalismo e pela habilidade política, mas também pela ardilosidade e pela hipocrisia. Eram muito estudiosos e hierosolimitas, não no sentido de terem nascido em Jerusalém, mas no sentido de que sua teologia e sua práxis moral tinha a cidade de Jerusalém como centro. Por isto, também eram templistas ou templocentristas. Mas não havia partido mais nacionalista que os zelotas (ou zelotes). Com Flávio Josefo e Oskar Skarsaune entendemos que os zelotes eram os fariseus mais radicais; eram direitopatas, extremistas conservadores de direita, se os dispuséssemos no modelo político atual. Eram libertários, intransigentes. Somente Deus os liderava. Para defender seus ideais e sua fé, pegavam até em armas e adotavam treinamento de guerrilha (p. 124).

MINHA CONCLUSÃO
O autor, nos capítulos primeiro e quinto, traz dois acontecimentos supra-importantes na história do judaísmo que mudaram não só a história deste como influenciaram sobremodo o desenvolvimento do cristianismo: a expansão grega alexandrina e a destruição do Templo hierosolimita. Se os estudantes mais avançados conseguem detectar vestígios de cultura, filosofia, linguística, história e teologia gregas no Novo Testamento, isto é porque o movimento expansionista grego, como nunca antes, criou uma filosofia de dominação que considerava a cultura local e promovia o sincretismo religioso. Se, ainda, tais estudantes percebem uma diferença entre o judaísmo neotestamentário e o veterotestamentário, isto se deve à destruição do Templo e, com ele, de quase todos os partidos e grupos judaicos, com seus diferentes “judaísmos”. Tal compreensão parece ter sido o desejo de Oskar Skarsaune.

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