Comentário
ao tópico O núcleo da teologia de Lutero
em três opúsculos, págs. 34-39, do livro Curso de Filosofia, de Battista Mondin.
Martin Luther, ou
Martinho Lutero (1483-1546), foi monge e sacerdote na Ordem dos Agostinianos.
Levantou-se contra os abusos da Igreja Católica Apostólica Romana. Seu nome é
de etimologia incerta, mas é provável que venha do germânico tardio,
influenciado pelo latim. Lutero
lembra Lother ou Lotário e é uma aglutinação das palavras chlodochar ou hlodari,
esta última derivada do radical hlut,
fama (port.), e hari, exército (port.).
Destarte, Lutero significaria,
etimologicamente, exército famoso. Enquanto
Martinho é adaptação portuguesa de Martin, que possui variante latina Martim e significa guerreiro. Portanto, Martinho
Lutero significa, etimologicamente, algo como guerreiro famoso. Curiosamente, ele foi o principal e mais famoso
“guerreiro” da Reforma Protestante. Suas 95
teses afixadas na igreja de Wittenberg solaparam o absolutismo papal de
Leão X, que fazia mais ou menos o que Edir Macedo (e companhia) faz hoje; ele
criou a pregação de indulgências com fins lucrativos para a construção
aberrante da basílica de são Pedro.
Mas Lutero não parou
por aqui! Ele tinha pressa, como pode-se depreender de uma frase sua: “Quem não for belo aos vinte anos, forte aos
trinta, esperto aos quarenta e rico aos cinquenta, não pode esperar ser tudo
isso depois”. Após acender a fogueira da Reforma e engendrar esperança
sócio-político-religiosa nos alemães, Lutero alçou voos mais altos em busca de
repercussão continental com seus três opúsculos principais, todos datados de
1520: A nobreza cristã da nação alemã, A
liberdade cristã e O cativeiro
babilônico da Igreja.
Em
A nobreza cristã da nação alemã, faz
duras críticas às três muralhas com as quais Roma se fortificara: a) a
submissão do poder secular, b) a interpretação autêntica da Escritura e c) o
direito exclusivo de convocar concílios ecumênicos.
“Os
romanistas, escreve
Lutero, com grande habilidade ergueram em
torno de si três muralhas, atrás das quais se defenderam de modo que até agora
ninguém pôde reformá-los, e com isso a cristandade decaiu horrivelmente. ‘Em
primeiro lugar’, quando se tentou constrangê-los com o poder secular,
estabeleceram e proclamaram que a autoridade secular não tinha nenhum direito
sobre eles e que, ao contrário, o poder espiritual era superior ao temporal.
‘Em segundo lugar’, tentou-se golpeá-los com a Sagrada Escritura, mas replicaram
que interpretar a Sagrada Escritura é competência somente do Papa e de nenhum
outro. ‘Em terceiro lugar’, procurou-se ameaçá-los com um Concílio (sic), mas inventaram que ninguém pode convocar o
Concílio (sic) a não ser o Papa.
Assim subtraíram traiçoeiramente todas as três varas e permanecem impunes e,
defendidos pelas três firmes muralhas, fazem toda sorte de patifarias e
maldades que estamos vendo”
p. 35
Contra
a primeira “muralha”, Lutero argumenta que o ofício das autoridades políticas não-sacerdotais
deve ser respeitado já que tais autoridades foram batizadas consoante o batismo
dos bispos e sacerdotes. Aqui, Lutero, porém, não se manifestou a respeito de
governantes não-cristãos. Contra a segunda “muralha”, Lutero mostra que nenhum
teólogo pode provar que somente o Papa pode interpretar corretamente as
Escrituras Sagradas. E, contra a terceira “muralha”, expõe que, em nenhum lugar
das Escrituras, encontra-se fundamento para demonstrar indubitavelmente que só
o Papa pode convocar um concílio, sendo esta exação, portanto, uma criação das
leis católicas. A Igreja, porém, fez-se de surda no início. Mas Lutero sabia
que os povos e os governos viviam num clima de esperança por liberdade
religiosa e política e aproveitou para conclamar os príncipes alemães a
protestarem contra o status quo servo
do absolutismo papal (daí veio o nome protestantismo). Só assim a Igreja foi
fortemente golpeada e viu-se na necessidade de reagir.
“A
paz, se possível, mas a verdade, a qualquer preço”
Lutero
No
opúsculo A liberdade cristã, Lutero
sintetiza sua principal doutrina: a da justificação pela fé. Nesta obra, afirma
que só a fé pode salvar, e não os esforços humanos (boas obras). Enfatiza a
importância da Lei como demonstradora da fraqueza dos homens e a necessidade
peremptória da guarda do Evangelho. Logo, a Lei é insuficiente para a salvação,
mas o Evangelho mostra a fé no Salvador como único caminho para o Céu: “O justo viverá pela fé”. Lutero
elaborou a doutrina da justificação pela fé após muitas meditações nas
Escrituras, mormente na Carta aos romanos,
e tensas experiências existenciais que quase o levaram à morte.
“A
medicina cria pessoas doentes, a matemática, pessoas tristes, e a teologia,
pecadores”
Lutero
Na
sua terceira obra de destaque, O
Cativeiro babilônico da Igreja, desenvolve a doutrina da justificação
acrescentando suas consequências eclesiológicas. Assim, se a justificação é operada unicamente por
meio de Deus, todas as estruturas eclesiásticas destinadas a medir a salvação
são desnecessárias e não só deve-se observar apenas dois sacramentos, a saber,
o batismo e a Santa Ceia, como, nestes, o que mais importa são as palavras com
as quais se anuncia a promessa salvífica de Deus.
"Uma
masmorra com Cristo é um trono, e um trono sem Cristo é um inferno"
Lutero
Ao
contrário do que se pode excogitar, a Igreja de Roma não condenou as 95 teses
luteranas, mas apenas 41, por intermédio da bula Exurge Domine, de 15 de junho de 1520, o ano mais crucial para a
Reforma. A Igreja ordenou queimar muitos livros escritos por Lutero e o
desligou resolutamente da Igreja. Em resposta, Lutero queimou a bula que o
excomungava na praça de Wittenberg. Em 1521, o imperador Carlos V o convocou
para a dieta (assembleia) de Wörms. Lutero não se retratou alegando que somente
o faria se houvesse uma revisão doutrinária na Igreja. Assim, foi banido pelo
imperador, sendo acolhido pelo príncipe Frederico da Saxônia, sua terra natal,
onde traduziu o Novo Testamento e,
depois, toda a Bíblia, para o saxão.
“A
mentira é como uma bola de neve; quanto mais rola, tanto mais aumenta”
Lutero
Se,
por um lado, Lutero não queria aceitar os disparates
teológico-polítco-eclesiásticos da Igreja Católica, esta também não estava
disposta a abrir mão de certas doutrinas. Isto porque, se a teologia católica
pregava a substancial bondade da natureza, a colaboração do homem para a
salvação e a ação intermediadora de sacerdotes nos atos e execuções rituais, a
nascente teologia luterana pressupunha a total depravação da natureza humana e,
corolariamente, a impossibilidade de qualquer mediação humana.
“As
boas obras não tornam bom o homem, mas o homem bom pratica boas obras. As obras
más não tornam mau o homem, mas o homem mau pratica obras más.”
Lutero
Expurgado
de Roma, Lutero fundou uma nova igreja com o intuito de desenvolver uma
teologia católica reformada dos vícios nefastos que a adoeciam, mas o que se
viu foi o crescimento paulatino do embrião da divisão, que já deixara um
estigma profundo em 1054 d.C.
“O mundo é como um
camponês embriagado; basta ajudá-lo a montar sobre a sela de um lado para ele
cair do outro logo em seguida”
Lutero
REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS E FONTES DA INTERNET
MONDIN, Battista. O núcleo da teologia de Lutero em três opúsculos. Martinho Lutero. Os
artífices da Reforma Protestante e os seus ideais. In.: Curso de Filosofia. São Paulo, Paulus,
12ª edição, 2011.