quinta-feira, 12 de setembro de 2013

O NÚCLEO DA TEOLOGIA DE LUTERO EM TRÊS OPÚSCULOS

Comentário ao tópico O núcleo da teologia de Lutero em três opúsculos, págs. 34-39, do livro Curso de Filosofia, de Battista Mondin.

 por Alan Francisco de Souza Lemos



Martin Luther, ou Martinho Lutero (1483-1546), foi monge e sacerdote na Ordem dos Agostinianos. Levantou-se contra os abusos da Igreja Católica Apostólica Romana. Seu nome é de etimologia incerta, mas é provável que venha do germânico tardio, influenciado pelo latim. Lutero lembra Lother ou Lotário e é uma aglutinação das palavras chlodochar ou hlodari, esta última derivada do radical hlut, fama (port.), e hari, exército (port.). Destarte, Lutero significaria, etimologicamente, exército famoso. Enquanto Martinho é adaptação portuguesa de Martin, que possui variante latina Martim e significa guerreiro. Portanto, Martinho Lutero significa, etimologicamente, algo como guerreiro famoso. Curiosamente, ele foi o principal e mais famoso “guerreiro” da Reforma Protestante. Suas 95 teses afixadas na igreja de Wittenberg solaparam o absolutismo papal de Leão X, que fazia mais ou menos o que Edir Macedo (e companhia) faz hoje; ele criou a pregação de indulgências com fins lucrativos para a construção aberrante da basílica de são Pedro.
Mas Lutero não parou por aqui! Ele tinha pressa, como pode-se depreender de uma frase sua: “Quem não for belo aos vinte anos, forte aos trinta, esperto aos quarenta e rico aos cinquenta, não pode esperar ser tudo isso depois”. Após acender a fogueira da Reforma e engendrar esperança sócio-político-religiosa nos alemães, Lutero alçou voos mais altos em busca de repercussão continental com seus três opúsculos principais, todos datados de 1520: A nobreza cristã da nação alemã, A liberdade cristã e O cativeiro babilônico da Igreja.
Em A nobreza cristã da nação alemã, faz duras críticas às três muralhas com as quais Roma se fortificara: a) a submissão do poder secular, b) a interpretação autêntica da Escritura e c) o direito exclusivo de convocar concílios ecumênicos.
“Os romanistas, escreve Lutero, com grande habilidade ergueram em torno de si três muralhas, atrás das quais se defenderam de modo que até agora ninguém pôde reformá-los, e com isso a cristandade decaiu horrivelmente. ‘Em primeiro lugar’, quando se tentou constrangê-los com o poder secular, estabeleceram e proclamaram que a autoridade secular não tinha nenhum direito sobre eles e que, ao contrário, o poder espiritual era superior ao temporal. ‘Em segundo lugar’, tentou-se golpeá-los com a Sagrada Escritura, mas replicaram que interpretar a Sagrada Escritura é competência somente do Papa e de nenhum outro. ‘Em terceiro lugar’, procurou-se ameaçá-los com um Concílio (sic), mas inventaram que ninguém pode convocar o Concílio (sic) a não ser o Papa. Assim subtraíram traiçoeiramente todas as três varas e permanecem impunes e, defendidos pelas três firmes muralhas, fazem toda sorte de patifarias e maldades que estamos vendo”
p. 35
Contra a primeira “muralha”, Lutero argumenta que o ofício das autoridades políticas não-sacerdotais deve ser respeitado já que tais autoridades foram batizadas consoante o batismo dos bispos e sacerdotes. Aqui, Lutero, porém, não se manifestou a respeito de governantes não-cristãos. Contra a segunda “muralha”, Lutero mostra que nenhum teólogo pode provar que somente o Papa pode interpretar corretamente as Escrituras Sagradas. E, contra a terceira “muralha”, expõe que, em nenhum lugar das Escrituras, encontra-se fundamento para demonstrar indubitavelmente que só o Papa pode convocar um concílio, sendo esta exação, portanto, uma criação das leis católicas. A Igreja, porém, fez-se de surda no início. Mas Lutero sabia que os povos e os governos viviam num clima de esperança por liberdade religiosa e política e aproveitou para conclamar os príncipes alemães a protestarem contra o status quo servo do absolutismo  papal (daí veio o nome protestantismo). Só assim a Igreja foi fortemente golpeada e viu-se na necessidade de reagir.

“A paz, se possível, mas a verdade, a qualquer preço”
Lutero
No opúsculo A liberdade cristã, Lutero sintetiza sua principal doutrina: a da justificação pela fé. Nesta obra, afirma que só a fé pode salvar, e não os esforços humanos (boas obras). Enfatiza a importância da Lei como demonstradora da fraqueza dos homens e a necessidade peremptória da guarda do Evangelho. Logo, a Lei é insuficiente para a salvação, mas o Evangelho mostra a fé no Salvador como único caminho para o Céu: “O justo viverá pela fé”. Lutero elaborou a doutrina da justificação pela fé após muitas meditações nas Escrituras, mormente na Carta aos romanos, e tensas experiências existenciais que quase o levaram à morte.

“A medicina cria pessoas doentes, a matemática, pessoas tristes, e a teologia, pecadores”
Lutero
Na sua terceira obra de destaque, O Cativeiro babilônico da Igreja, desenvolve a doutrina da justificação acrescentando suas consequências eclesiológicas. Assim,  se a justificação é operada unicamente por meio de Deus, todas as estruturas eclesiásticas destinadas a medir a salvação são desnecessárias e não só deve-se observar apenas dois sacramentos, a saber, o batismo e a Santa Ceia, como, nestes, o que mais importa são as palavras com as quais se anuncia a promessa salvífica de Deus.

"Uma masmorra com Cristo é um trono, e um trono sem Cristo é um inferno"
Lutero
Ao contrário do que se pode excogitar, a Igreja de Roma não condenou as 95 teses luteranas, mas apenas 41, por intermédio da bula Exurge Domine, de 15 de junho de 1520, o ano mais crucial para a Reforma. A Igreja ordenou queimar muitos livros escritos por Lutero e o desligou resolutamente da Igreja. Em resposta, Lutero queimou a bula que o excomungava na praça de Wittenberg. Em 1521, o imperador Carlos V o convocou para a dieta (assembleia) de Wörms. Lutero não se retratou alegando que somente o faria se houvesse uma revisão doutrinária na Igreja. Assim, foi banido pelo imperador, sendo acolhido pelo príncipe Frederico da Saxônia, sua terra natal, onde traduziu o Novo Testamento e, depois, toda a Bíblia, para o saxão.
“A mentira é como uma bola de neve; quanto mais rola, tanto mais aumenta”
Lutero
Se, por um lado, Lutero não queria aceitar os disparates teológico-polítco-eclesiásticos da Igreja Católica, esta também não estava disposta a abrir mão de certas doutrinas. Isto porque, se a teologia católica pregava a substancial bondade da natureza, a colaboração do homem para a salvação e a ação intermediadora de sacerdotes nos atos e execuções rituais, a nascente teologia luterana pressupunha a total depravação da natureza humana e, corolariamente, a impossibilidade de qualquer mediação humana.

“As boas obras não tornam bom o homem, mas o homem bom pratica boas obras. As obras más não tornam mau o homem, mas o homem mau pratica obras más.”
Lutero
Expurgado de Roma, Lutero fundou uma nova igreja com o intuito de desenvolver uma teologia católica reformada dos vícios nefastos que a adoeciam, mas o que se viu foi o crescimento paulatino do embrião da divisão, que já deixara um estigma profundo em 1054 d.C.

“O mundo é como um camponês embriagado; basta ajudá-lo a montar sobre a sela de um lado para ele cair do outro logo em seguida”
Lutero















REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS E FONTES DA INTERNET

MONDIN, Battista. O núcleo da teologia de Lutero em três opúsculos. Martinho Lutero. Os artífices da Reforma Protestante e os seus ideais. In.: Curso de Filosofia. São Paulo, Paulus, 12ª edição, 2011.



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