Artigo do Padre José do Vale
Reformador Intolerante - João Calvino
21.11.2012 - “João Calvino governou Genebra tão brutalmente quanto Josef Stalin, na Rússia” Robert Wrigh(1) - Ensaísta e escritor americano
João Calvino nasceu em Noyon, França, em 1509. Ele fundou um movimento religioso que desempenhou um papel importante na vida de muitas pessoas na Europa, nas Américas, na África do Sul e em outros lugares. Calvino é considerado um dos maiores reformadores na história ocidental.
Em resultado de Reforma, as cidades e os Estados individualmente declararam sua sujeição ao catolicismo, ao luteranismo ou ao calvinismo, transformando a Europa num foco de desunião religiosa. Embora os Reformadores estivessem unidos em criticar a Igreja Católica, eles discordavam entre si. A Dra. Sabine Witt, curadora do Museu Histórico da Alemanha, em Berlim, diz: “Desacordos Teológicos se desenvolveram até mesmo entre os protestantes”.
Os três principais reformadores são de nacionalidades diferentes, doutrinas, (ou heresias) diferentes, intolerâncias e brutalidades diferentes.
Martinho Lutero, alemão e conivente com a carnificina dos pobres camponeses em 1525, mais de 150 mil foram mortos. Huldreich Zwínglio, suíço, morreu numa batalha em Cappel em 1531, nessa sangrenta batalha, segundo alguns historiadores, Zwínglio tombou segurando a Bíblia em uma mão e na outra a espada.
O protestantismo nasceu dentro de um contexto de conflitos sangrentos, falta de comunhão entre os próprios líderes, governos eclesiásticos incompatíveis entre si, o mais belo Sacramento: a Eucaristia não unem os protestantes, a Bíblia é interpretada escandalosamente, cismas e heresias continuam a envergonhar o cristianismo. Foi com muita razão que o intelectual inglês e ex-protestante John Henry Newman afirmou: “Aprofundar o conhecimento a cerca da história é abdicar do protestantismo”.
Calvino atacou os ensinos católicos e manteve sua posição a respeito da base de sua crença – a soberania de Deus e predestinação. Além do impacto nos assuntos religiosos, o livro Instituição Cristã, de Calvino, é também conhecido por sua influencia na língua e no estilo literário francês. Calvino foi aclamado como um dos mais importantes reformadores da História. Por fim, ele se estabeleceu em Genebra, Suíça, e de 1541 em diante fez dessa cidade o centro de suas reformas ditatoriais.
Em resultado de Reforma, as cidades e os Estados individualmente declararam sua sujeição ao catolicismo, ao luteranismo ou ao calvinismo, transformando a Europa num foco de desunião religiosa. Embora os Reformadores estivessem unidos em criticar a Igreja Católica, eles discordavam entre si. A Dra. Sabine Witt, curadora do Museu Histórico da Alemanha, em Berlim, diz: “Desacordos Teológicos se desenvolveram até mesmo entre os protestantes”.
Os três principais reformadores são de nacionalidades diferentes, doutrinas, (ou heresias) diferentes, intolerâncias e brutalidades diferentes.
Martinho Lutero, alemão e conivente com a carnificina dos pobres camponeses em 1525, mais de 150 mil foram mortos. Huldreich Zwínglio, suíço, morreu numa batalha em Cappel em 1531, nessa sangrenta batalha, segundo alguns historiadores, Zwínglio tombou segurando a Bíblia em uma mão e na outra a espada.
O protestantismo nasceu dentro de um contexto de conflitos sangrentos, falta de comunhão entre os próprios líderes, governos eclesiásticos incompatíveis entre si, o mais belo Sacramento: a Eucaristia não unem os protestantes, a Bíblia é interpretada escandalosamente, cismas e heresias continuam a envergonhar o cristianismo. Foi com muita razão que o intelectual inglês e ex-protestante John Henry Newman afirmou: “Aprofundar o conhecimento a cerca da história é abdicar do protestantismo”.
Calvino atacou os ensinos católicos e manteve sua posição a respeito da base de sua crença – a soberania de Deus e predestinação. Além do impacto nos assuntos religiosos, o livro Instituição Cristã, de Calvino, é também conhecido por sua influencia na língua e no estilo literário francês. Calvino foi aclamado como um dos mais importantes reformadores da História. Por fim, ele se estabeleceu em Genebra, Suíça, e de 1541 em diante fez dessa cidade o centro de suas reformas ditatoriais.
As Reformas em Genebra
Calvino exerceu uma poderosa influência em Genebra. Motivado por um forte senso de moralidade e justiça, ele transformou Genebra de “uma cidade com má reputação em uma cidade onde um estrito código de moral regulamentava a vida de todos” observa a The Encyclopedia of Religion (Enciclopédia da Religião). Também houve outras mudanças. A Dra. Sabine Witt diz: “Em resultado das guerras religiosas na França, a população de Genebra dobrou em poucos anos por causa de milhares de protestantes que se refugiaram ali”. Os huguenotes, que seguiam a mesma ética de trabalho de Calvino, impulsionaram a economia da cidade, fazendo de Genebra um centro de impressão e de fabricação de relógios. Daí o prelúdio do capitalismo.
Refugiados de outros países também foram para Genebra, incluindo muitos da Inglaterra, onde os protestantes estavam sob ameaças da Rainha Maria I. Assim, formados em geral por uma minoria de exilados, os calvinistas desenvolveram o que a revista religiosa Christ in der Gegenwart chama de “teologia dos perseguidos”. Em 1560, os refugiados publicaram a Bíblia de Genebra, a primeira Bíblia em inglês que continua a divisão numérica dos versículos. Por ser pequena, essa Bíblia facilitava o estudo pessoal da Palavra de Deus. É provável que os puritanos tenham levado essa tradução da Bíblia para a América do Norte quando emigraram para lá em 1620.
No entanto, Genebra não era um lugar seguro para todos. Miguel Servet, nascido em 1511 na Espanha, estudou grego, latim, hebraico, advocacia e medicina, e talvez tenha conhecido Calvino quando os dois estudavam em Paris. Servet percebeu pelo seu estudo da Bíblia que a doutrina da Trindade não era bíblica. Ele tentou se corresponder com Calvino sobre esse assunto, mas Calvino encarava Servet como um inimigo. Perseguido pelos católicos na França, Servet fugiu para Genebra, a cidade de Calvino. Em vez de ser bem acolhido, ele foi preso, julgado por heresia e queimado na estaca em 1553. “A execução de Servet continua a ser uma marca desonrosa na vida e no trabalho do grande Reformador João Calvino”, diz o historiador alemão Friedrich Oehninger.
Calvino trabalhou muito ao passo que procurava alcançar seu objetivo de reformar a Igreja. Diz-se que ele escreveu mais de cem obras de referência e mil cartas, e proferiu uns 4 mil sermões em Genebra. Por meio de todo esse trabalho, Calvino não só apresentou seu ponto de vista sobre o cristianismo, mas também tentou obrigar as pessoas a seguir o cristianismo da forma que ele achava ser a melhor, especialmente em Genebra, o lugar que ele sonhava transformar numa cidade de Deus.
O que Calvino conseguiu realizar em Genebra com seus esforços incansáveis? De acordo com a Agência Federal de Estatísticas da Suíça, no ano 2000, apenas 16% dos habitantes de Genebra pertenciam à Igreja Reformada (calvinista), é há mais católicos do que calvinistas naquela cidade.
Refugiados de outros países também foram para Genebra, incluindo muitos da Inglaterra, onde os protestantes estavam sob ameaças da Rainha Maria I. Assim, formados em geral por uma minoria de exilados, os calvinistas desenvolveram o que a revista religiosa Christ in der Gegenwart chama de “teologia dos perseguidos”. Em 1560, os refugiados publicaram a Bíblia de Genebra, a primeira Bíblia em inglês que continua a divisão numérica dos versículos. Por ser pequena, essa Bíblia facilitava o estudo pessoal da Palavra de Deus. É provável que os puritanos tenham levado essa tradução da Bíblia para a América do Norte quando emigraram para lá em 1620.
No entanto, Genebra não era um lugar seguro para todos. Miguel Servet, nascido em 1511 na Espanha, estudou grego, latim, hebraico, advocacia e medicina, e talvez tenha conhecido Calvino quando os dois estudavam em Paris. Servet percebeu pelo seu estudo da Bíblia que a doutrina da Trindade não era bíblica. Ele tentou se corresponder com Calvino sobre esse assunto, mas Calvino encarava Servet como um inimigo. Perseguido pelos católicos na França, Servet fugiu para Genebra, a cidade de Calvino. Em vez de ser bem acolhido, ele foi preso, julgado por heresia e queimado na estaca em 1553. “A execução de Servet continua a ser uma marca desonrosa na vida e no trabalho do grande Reformador João Calvino”, diz o historiador alemão Friedrich Oehninger.
Calvino trabalhou muito ao passo que procurava alcançar seu objetivo de reformar a Igreja. Diz-se que ele escreveu mais de cem obras de referência e mil cartas, e proferiu uns 4 mil sermões em Genebra. Por meio de todo esse trabalho, Calvino não só apresentou seu ponto de vista sobre o cristianismo, mas também tentou obrigar as pessoas a seguir o cristianismo da forma que ele achava ser a melhor, especialmente em Genebra, o lugar que ele sonhava transformar numa cidade de Deus.
O que Calvino conseguiu realizar em Genebra com seus esforços incansáveis? De acordo com a Agência Federal de Estatísticas da Suíça, no ano 2000, apenas 16% dos habitantes de Genebra pertenciam à Igreja Reformada (calvinista), é há mais católicos do que calvinistas naquela cidade.
TERROR DE CALVINO EM GENEGRA
“A ditadura do austero reformador João Calvino encontra poucos exemplos na história, pelo terror, desconfiança e atmosfera de opressão que soube criar na esplêndida cidade de Genebra”.
A. Galli e D. Grandi (2) - Historiadores eclesiásticos italiano. - Autores da obra História da Igreja
A. Galli e D. Grandi (2) - Historiadores eclesiásticos italiano. - Autores da obra História da Igreja
Em 1542, Calvino publica em Genebra o seu livro de catecismo: "Catéchisme de l'Église de Genève, c'est-a-dire, le formulaire d'instruire les enfants en la chrétienté". A chave do projeto de Calvino passa pela pedagogia. O seu objetivo é a profunda transformação das mentalidades. Cada resquício de superstição, de práticas de magia, ou de catolicismo é perseguido como idolatria que pode chegar sentença de morte.
O consistório, do qual Calvino fazia parte, ocupava-se desses e de outros casos. Refiram-se alguns:
Em 1542, uma mulher chamada Jeanne Petreman é acusada de se recusar a participar da eucaristia, de dizer o pai-nosso em língua "romana" e de proclamar que a Virgem Maria era a sua defensora. Diz também que se nega a acreditar noutra fé que não a sua. É excomungada.
Em 2 de Setembro de 1546, aparece em Genebra um franciscano que pedia na rua um jantar em nome de Deus e da Virgem Maria. Devemos pressupor que ele obteve o seu jantar, mas foi também levado ao consistório, que logo constatou que o "papista" mal conhecia a bíblia, além de ser inofensivo. Foi expulso da cidade, para o lado da fronteira, com os católicos.
A 23 de Junho de 1547 comparecem perante o consistório várias mulheres que tinham sido apanhadas a dançar - uma delas era a esposa de um dos membros do consistório. O caso ganhou contornos de escândalo. As mulheres foram condenadas a alguns dias de prisão, apesar de vários apelos. Em reação à decisão, são colocados na cidade cartazes contra Calvino. O autor dos cartazes, Jacques Gruet, é torturado. Depois de confessar a sua autoria, é executado.
Em 1548, Louis Le Barbier é interrogado sobre a sua fé. Declara que não tem fé. Entretanto, descobrem livros de bruxaria e de escárnio na sua posse. É admoestado perante o consistório, mas não será perseguido.
Os nomes de baptismo são regulamentados. Devem ser nomes que figuram na Bíblia. Um decreto de 22 de Novembro de 1546 dispõe que certos nomes são proibidos, entre os quais:
Suaire, Claude, Mama (lembram a idolatria)
Baptistes, Juge, Evangéliste
Dieu le Fils, Espoir, Emmanuel, Sauveur, Jésus (destinados apenas a nosso senhor)
Sépulcre, Croix, Noël, Pâques, Chrétien (nomes estúpidos ou absurdos)
O luxo e a pompa são desprezados. Em setembro de 1558, Nicolas des Gallars, um amigo de Calvino, inicia uma grande campanha na cidade em desprezo do supérfluo, as modas entre as mulheres e as más leituras. São queimados vários exemplares do livro "Amadis de Gaula", na posse de um comerciante. A radicalidade pelo “zelo religioso” tomava a forma de censura moral e mortal.
Peste Negra em Genebra
Em 1542, há um surto de peste negra em Genebra. A peste negra permanecia então um fenómeno incompreensível - para lidar com a epidemia, era normal que se multiplicassem os casos de feitiçaria e de rituais contra a peste. Este tipo de práticas já era conhecido em Genebra antes da reforma e, tal como antes, os protestantes replicam com a perseguição, tortura e morte dos suspeitos. Aquelas que são identificadas como bruxas são queimadas vivas, enquanto se propaga a ideia de que estas desgraças são um castigo de Deus.
Crescimento Demográfico
A partir de 1542 e, sobretudo na década de 1550, a cidade de Genebra vai conhecer um grande crescimento demográfico, com a chegada de refugiados franceses, protestantes perseguidos em França. Consequentemente, há uma fase de expansão económica (relojoaria, tecelagem…) e a língua francesa começa a ter preponderância sobre o dialeto franco-provençal da região.
Mas é também uma época marcada pelo crescimento de sentimentos xenófobos, em parte devidos a ressentimentos contra Calvino:
Em Janeiro de 1546 é preso Pierre Ameaux, que tinha injuriado publicamente Calvino, ao referir-se a este como um "picard", pregador de uma falsa fé.
Um outro senhor Ameaux é preso mais tarde por razões semelhantes. Este senhor tinha boas razões para não gostar do extremo zelo religioso imposto por Calvino, já que era fabricante de cartas de jogo. Foi condenado a percorrer a cidade de uma ponta à outra, descalço, em camisa, com uma vela na mão.
A 23 de Setembro de 1547, François Favre comparece em tribunal por ter afirmado que Calvino se auto-nomeara bispo de Genebra e que os franceses tinham escravizado a sua cidade natal.
Mais tarde, em 1548, um senhor chamado Nicole Bromet declara que os franceses deveriam ser todos colocados num barco e enviados pelo rio Reno abaixo.
Em 1547, Henrique II de França sucede a Francisco I. Henrique será um rei menos reconhecido, em comparação com Francisco. É caracterizado como menos carismático, menos entusiasta pelas artes e ciências, mais introvertido e frio.
Em 1550 a repressão dos huguenotes em França cresce. É estabelecida a chambre ardente. A censura é fortalecida.
A Morte de Miguel Servet Por Calvino
Aos 20 anos de idade, Miguel Servet (1511-1553), um espanhou formado em advocacia e medicina, publicou De Trinitatis erroribus (Erros da Trindade), em que declarou que “não usaria a palavra Trindade, que não se encontra nas Escrituras Sagradas, e que apenas parece perpetuar erros filosóficos”. Ele denunciou a Trindade como doutrina “que não dá para entender, impossível na ordem natural das coisas e que pode até mesmo ser considerada blasfema!”.
Servet era um homem de muita cultura, estudioso de vários assuntos, principalmente sobre religião. Como livre pensador, defendia que o dogma da Trindade não fazia qualquer sentido, sendo apenas um sofisma inventado no Primeiro Concílio de Niceia. Será perseguido pela Igreja Católica na França, através da Inquisição, por causa das suas teses. Escapa e dirige-se a Genebra, mas os protestantes mostraram-se não menos intolerantes para com as suas ideias.
A história da ligação entre Servet e Calvino começa já em 1534, ano em que ambos estiveram em Paris. Esteve nessa altura planejado um encontro que não chegou a realizar-se. No entanto, trocariam correspondência por vários anos.
O debate foi tornando-se numa azeda discussão. Um dos pontos principais da discussão epistolar continuava a ser a Santíssima Trindade. Perante a sua proposta para que Calvino lesse o manuscrito do seu Livro "Restitutio" (tendo-o enviado pelo correio), Calvino diz-lhe que deveria ler o seu "Institutio". Servet fê-lo e escreveu comentários críticos nas margens do texto que foram depois enviados a Calvino.
Calvino recebeu o manuscrito, mas não lhe respondeu. Nem sequer devolveu o manuscrito do Restitutio, que Servet lhe pedia que remetesse. Calvino manteve o seu silêncio, cultivando preocupação em relação à Servet e às suas heresias.
No princípio de Abril de 1553 a Inquisição francesa recebeu misteriosamente a posse de documentos que comprometiam Servet. Entre eles, as cartas de Servet a Calvino. Ainda em 5 de Abril, Servet é ouvido pelos inquisidores. A 7 de Abril, porém, consegue escapar-se da prisão. Dirigiu-se a Genebra, talvez por pensar que entre os protestantes estaria a salvo da Inquisição. Enganou-se. Foi preso pelas autoridades da cidade de Genebra a 13 de Agosto.
Servet desejava fugir para a Itália, porém, inexplicavelmente, parou em Genebra, onde Calvino e seus reformadores o denunciaram. Em 13 de agosto, ele ouviu um sermão de Calvino em Genebra e foi imediatamente reconhecido e preso. Calvino insistiu na condenação de Servet usando todos os meios ao seu comando.
Calvino, também acusado pelos católicos de arianismo, poderá ter visto aqui a oportunidade de mostrar que defendia o conceito trinitário, ao mesmo tempo em que mostraria que também estava empenhado em perseguir os heréticos. “Um herético do lado de lá da fronteira também é um herético dentro da cidade”, disse Calvino.
Em seu julgamento pelo Conselho de Genebra presidido por Calvino, segundo a maioria dos historiadores, Servet foi condenado pela difusão e pregação do Antitrinitarismo e por ser contra o batismo infantil. O procurador (procurador-chefe público), acrescentou algumas acusações como "se ele não sabia que sua doutrina era perniciosa, considerando que ela favorece os judeus e os turcos, por inventar desculpas para eles, e se ele não estudou o Alcorão, a fim de desmentir e rebater as doutrina e a religião das igrejas cristãs(...)".
Calvino acreditava que Servet mereceu ser morto por causa do que ele denominou como "blasfêmias execráveis." Calvino consultou outros reformadores sobre a questão de Servet, como os seguidores de Martinho Lutero, e em locais como Zurique, Berna, Basel e Schaffhausen, que concordaram universalmente com sua execução.
Em 24 de outubro Servet foi condenado à morte na fogueira por negar a Trindade e o batismo infantil. Calvino sugeriu que Servet fosse executado por decapitação, em vez de fogo, mais seu pedido não foi atendido. Em 27 de outubro de 1553 a pena foi aplicada nos arredores de Genebra com o que se acreditava ser a última cópia de seu livro acorrentado a perna de Servet. Após o ocorrido Calvino escreveu:
“Quem sustenta que é errado punir hereges e blasfemadores, pois nos tornamos cúmplices de seus crimes (…). Não se trata aqui da autoridade do homem, é Deus que fala (…). Portanto se Ele exigir de nós algo de tão extrema gravidade, para que mostremos que lhe pagamos a honra devida, estabelecendo o seu serviço acima de toda consideração humana, que não poupamos parentes, nem de qualquer sangue, e esquecemos toda a humanidade, quando o assunto é o combate pela Sua glória” (3).
Calvino justificou suas ações intolerantes com estas palavras: “Se os papistas são tão duros e violentos na defesa de suas superstições que cruelmente derramam sangue inocente, não devem os magistrados cristãos se envergonhar de serem menos ardentes na defesa da segura verdade?” O poder político, a glória terrena, fanatismo religioso e o ódio pessoal de Calvino cegaram seu julgamento e sufocaram os ensinamentos evangélicos. Seus atos cruéis foram colocados acima do perdão e do amor de Deus.
O consistório, do qual Calvino fazia parte, ocupava-se desses e de outros casos. Refiram-se alguns:
Em 1542, uma mulher chamada Jeanne Petreman é acusada de se recusar a participar da eucaristia, de dizer o pai-nosso em língua "romana" e de proclamar que a Virgem Maria era a sua defensora. Diz também que se nega a acreditar noutra fé que não a sua. É excomungada.
Em 2 de Setembro de 1546, aparece em Genebra um franciscano que pedia na rua um jantar em nome de Deus e da Virgem Maria. Devemos pressupor que ele obteve o seu jantar, mas foi também levado ao consistório, que logo constatou que o "papista" mal conhecia a bíblia, além de ser inofensivo. Foi expulso da cidade, para o lado da fronteira, com os católicos.
A 23 de Junho de 1547 comparecem perante o consistório várias mulheres que tinham sido apanhadas a dançar - uma delas era a esposa de um dos membros do consistório. O caso ganhou contornos de escândalo. As mulheres foram condenadas a alguns dias de prisão, apesar de vários apelos. Em reação à decisão, são colocados na cidade cartazes contra Calvino. O autor dos cartazes, Jacques Gruet, é torturado. Depois de confessar a sua autoria, é executado.
Em 1548, Louis Le Barbier é interrogado sobre a sua fé. Declara que não tem fé. Entretanto, descobrem livros de bruxaria e de escárnio na sua posse. É admoestado perante o consistório, mas não será perseguido.
Os nomes de baptismo são regulamentados. Devem ser nomes que figuram na Bíblia. Um decreto de 22 de Novembro de 1546 dispõe que certos nomes são proibidos, entre os quais:
Suaire, Claude, Mama (lembram a idolatria)
Baptistes, Juge, Evangéliste
Dieu le Fils, Espoir, Emmanuel, Sauveur, Jésus (destinados apenas a nosso senhor)
Sépulcre, Croix, Noël, Pâques, Chrétien (nomes estúpidos ou absurdos)
O luxo e a pompa são desprezados. Em setembro de 1558, Nicolas des Gallars, um amigo de Calvino, inicia uma grande campanha na cidade em desprezo do supérfluo, as modas entre as mulheres e as más leituras. São queimados vários exemplares do livro "Amadis de Gaula", na posse de um comerciante. A radicalidade pelo “zelo religioso” tomava a forma de censura moral e mortal.
Peste Negra em Genebra
Em 1542, há um surto de peste negra em Genebra. A peste negra permanecia então um fenómeno incompreensível - para lidar com a epidemia, era normal que se multiplicassem os casos de feitiçaria e de rituais contra a peste. Este tipo de práticas já era conhecido em Genebra antes da reforma e, tal como antes, os protestantes replicam com a perseguição, tortura e morte dos suspeitos. Aquelas que são identificadas como bruxas são queimadas vivas, enquanto se propaga a ideia de que estas desgraças são um castigo de Deus.
Crescimento Demográfico
A partir de 1542 e, sobretudo na década de 1550, a cidade de Genebra vai conhecer um grande crescimento demográfico, com a chegada de refugiados franceses, protestantes perseguidos em França. Consequentemente, há uma fase de expansão económica (relojoaria, tecelagem…) e a língua francesa começa a ter preponderância sobre o dialeto franco-provençal da região.
Mas é também uma época marcada pelo crescimento de sentimentos xenófobos, em parte devidos a ressentimentos contra Calvino:
Em Janeiro de 1546 é preso Pierre Ameaux, que tinha injuriado publicamente Calvino, ao referir-se a este como um "picard", pregador de uma falsa fé.
Um outro senhor Ameaux é preso mais tarde por razões semelhantes. Este senhor tinha boas razões para não gostar do extremo zelo religioso imposto por Calvino, já que era fabricante de cartas de jogo. Foi condenado a percorrer a cidade de uma ponta à outra, descalço, em camisa, com uma vela na mão.
A 23 de Setembro de 1547, François Favre comparece em tribunal por ter afirmado que Calvino se auto-nomeara bispo de Genebra e que os franceses tinham escravizado a sua cidade natal.
Mais tarde, em 1548, um senhor chamado Nicole Bromet declara que os franceses deveriam ser todos colocados num barco e enviados pelo rio Reno abaixo.
Em 1547, Henrique II de França sucede a Francisco I. Henrique será um rei menos reconhecido, em comparação com Francisco. É caracterizado como menos carismático, menos entusiasta pelas artes e ciências, mais introvertido e frio.
Em 1550 a repressão dos huguenotes em França cresce. É estabelecida a chambre ardente. A censura é fortalecida.
A Morte de Miguel Servet Por Calvino
Aos 20 anos de idade, Miguel Servet (1511-1553), um espanhou formado em advocacia e medicina, publicou De Trinitatis erroribus (Erros da Trindade), em que declarou que “não usaria a palavra Trindade, que não se encontra nas Escrituras Sagradas, e que apenas parece perpetuar erros filosóficos”. Ele denunciou a Trindade como doutrina “que não dá para entender, impossível na ordem natural das coisas e que pode até mesmo ser considerada blasfema!”.
Servet era um homem de muita cultura, estudioso de vários assuntos, principalmente sobre religião. Como livre pensador, defendia que o dogma da Trindade não fazia qualquer sentido, sendo apenas um sofisma inventado no Primeiro Concílio de Niceia. Será perseguido pela Igreja Católica na França, através da Inquisição, por causa das suas teses. Escapa e dirige-se a Genebra, mas os protestantes mostraram-se não menos intolerantes para com as suas ideias.
A história da ligação entre Servet e Calvino começa já em 1534, ano em que ambos estiveram em Paris. Esteve nessa altura planejado um encontro que não chegou a realizar-se. No entanto, trocariam correspondência por vários anos.
O debate foi tornando-se numa azeda discussão. Um dos pontos principais da discussão epistolar continuava a ser a Santíssima Trindade. Perante a sua proposta para que Calvino lesse o manuscrito do seu Livro "Restitutio" (tendo-o enviado pelo correio), Calvino diz-lhe que deveria ler o seu "Institutio". Servet fê-lo e escreveu comentários críticos nas margens do texto que foram depois enviados a Calvino.
Calvino recebeu o manuscrito, mas não lhe respondeu. Nem sequer devolveu o manuscrito do Restitutio, que Servet lhe pedia que remetesse. Calvino manteve o seu silêncio, cultivando preocupação em relação à Servet e às suas heresias.
No princípio de Abril de 1553 a Inquisição francesa recebeu misteriosamente a posse de documentos que comprometiam Servet. Entre eles, as cartas de Servet a Calvino. Ainda em 5 de Abril, Servet é ouvido pelos inquisidores. A 7 de Abril, porém, consegue escapar-se da prisão. Dirigiu-se a Genebra, talvez por pensar que entre os protestantes estaria a salvo da Inquisição. Enganou-se. Foi preso pelas autoridades da cidade de Genebra a 13 de Agosto.
Servet desejava fugir para a Itália, porém, inexplicavelmente, parou em Genebra, onde Calvino e seus reformadores o denunciaram. Em 13 de agosto, ele ouviu um sermão de Calvino em Genebra e foi imediatamente reconhecido e preso. Calvino insistiu na condenação de Servet usando todos os meios ao seu comando.
Calvino, também acusado pelos católicos de arianismo, poderá ter visto aqui a oportunidade de mostrar que defendia o conceito trinitário, ao mesmo tempo em que mostraria que também estava empenhado em perseguir os heréticos. “Um herético do lado de lá da fronteira também é um herético dentro da cidade”, disse Calvino.
Em seu julgamento pelo Conselho de Genebra presidido por Calvino, segundo a maioria dos historiadores, Servet foi condenado pela difusão e pregação do Antitrinitarismo e por ser contra o batismo infantil. O procurador (procurador-chefe público), acrescentou algumas acusações como "se ele não sabia que sua doutrina era perniciosa, considerando que ela favorece os judeus e os turcos, por inventar desculpas para eles, e se ele não estudou o Alcorão, a fim de desmentir e rebater as doutrina e a religião das igrejas cristãs(...)".
Calvino acreditava que Servet mereceu ser morto por causa do que ele denominou como "blasfêmias execráveis." Calvino consultou outros reformadores sobre a questão de Servet, como os seguidores de Martinho Lutero, e em locais como Zurique, Berna, Basel e Schaffhausen, que concordaram universalmente com sua execução.
Em 24 de outubro Servet foi condenado à morte na fogueira por negar a Trindade e o batismo infantil. Calvino sugeriu que Servet fosse executado por decapitação, em vez de fogo, mais seu pedido não foi atendido. Em 27 de outubro de 1553 a pena foi aplicada nos arredores de Genebra com o que se acreditava ser a última cópia de seu livro acorrentado a perna de Servet. Após o ocorrido Calvino escreveu:
“Quem sustenta que é errado punir hereges e blasfemadores, pois nos tornamos cúmplices de seus crimes (…). Não se trata aqui da autoridade do homem, é Deus que fala (…). Portanto se Ele exigir de nós algo de tão extrema gravidade, para que mostremos que lhe pagamos a honra devida, estabelecendo o seu serviço acima de toda consideração humana, que não poupamos parentes, nem de qualquer sangue, e esquecemos toda a humanidade, quando o assunto é o combate pela Sua glória” (3).
Calvino justificou suas ações intolerantes com estas palavras: “Se os papistas são tão duros e violentos na defesa de suas superstições que cruelmente derramam sangue inocente, não devem os magistrados cristãos se envergonhar de serem menos ardentes na defesa da segura verdade?” O poder político, a glória terrena, fanatismo religioso e o ódio pessoal de Calvino cegaram seu julgamento e sufocaram os ensinamentos evangélicos. Seus atos cruéis foram colocados acima do perdão e do amor de Deus.
Uma Mancha no Legado de Calvino
No século XX, a Igreja Reformada Holandesa, calvinista, usou o ensino da predestinação como base para a discriminação racial na África do Sul. Sobre a política adotada pelo governo a respeito da supremacia branca, Nelson Mandela, que se tornou o primeiro presidente negro da África do Sul, disse: “Essa política teve o apoio da Igreja Reformada Holandesa, que forneceu ao apartheid uma base religiosa por dar a entender que os africânderes eram o povo escolhido de Deus e que os negros eram uma espécie subserviente. No ponto de vista dos africânderes, o apartheid e a igreja andavam de mãos dadas”.
Nos anos 90, a Igreja Reformada Holandesa se desculpou publicamente por seu apoio ao apartheid. De modo formal, na chamada Declaração de Rustenbrug, os líderes da igreja reconheceram: “Alguns de nós usamos ativamente a Bíblia de forma errada para justificar o apartheid, levando muitos a crer que esse regime tinha a aprovação de Deus”. Ao longo dos anos, a posição da igreja com relação ao apartheid não só levou ao sofrimento resultante do preconceito racial, mas também sugeriu que Deus era o culpado.
João Calvino morreu em Genebra em 1564. Relata-se que, no fim de sua vida, ele agradeceu aos seus colegas religiosos “por terem dado tanta honra a uma pessoa que com certeza não merecia”, e implorou perdão por suas persistentes franquezas de impaciência, intolerância e ira.
Nos anos 90, a Igreja Reformada Holandesa se desculpou publicamente por seu apoio ao apartheid. De modo formal, na chamada Declaração de Rustenbrug, os líderes da igreja reconheceram: “Alguns de nós usamos ativamente a Bíblia de forma errada para justificar o apartheid, levando muitos a crer que esse regime tinha a aprovação de Deus”. Ao longo dos anos, a posição da igreja com relação ao apartheid não só levou ao sofrimento resultante do preconceito racial, mas também sugeriu que Deus era o culpado.
João Calvino morreu em Genebra em 1564. Relata-se que, no fim de sua vida, ele agradeceu aos seus colegas religiosos “por terem dado tanta honra a uma pessoa que com certeza não merecia”, e implorou perdão por suas persistentes franquezas de impaciência, intolerância e ira.
Pe. Inácio José do Vale
Professor de História da Igreja
Instituto Teológico Bento XVI
Sociólogo em Ciência da Religião
Pesquisador de Seitas e Heresias
E-mail: pe.inacio.jose@gmail.com
www.rainhamaria.com.br
Notas:
(1) Veja, 26/12/2001, p. 106.
(2) A. Galli e D. Grandi. História da Igreja. II edição. São Paulo. Edições Paulinas, 1964, p. 219.
(3) John Marshall, John Locke, Toleration and Early Enlightenment Culture (Cambridge Studies in Early Modern British History), Cambridge University Press, 2006, p. 325.
Bibliografia
CHADWICK, Owen. A Reforma. (Coleção História da Igreja - Vol. 3), Lisboa, Edições Pelicano, 1966.
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JOHNSON, Paul. História do Cristianismo, São Paulo: Imago, 2001.
CAIRNS Earle E. O Cristianismo através dos séculos: Uma História da Igreja Cristã, Edições Vida Nova, São Paulo: 1995.
GONZALES Justo L., Uma História Ilustrada do Cristianismo, coleção em 10 volumes, Edições Vida Nova, São Paulo: 1995
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